Histórias leves, irreverentes e divertidas que tiveram como palco, o mundo. Não pretendo ser um guia de viagens, nem dar dicas ou coisa que o valha. Quero me divertir escrevendo e que as pessoas divirtam-se lendo, imaginando, degustando. Siga-me se puder.
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quarta-feira, 20 de novembro de 2019
Barra Grande - Aurículas e Ventrículos, Sangue e Água Salgada
Naquele pedacinho de terra ali, ao longo do mar, entre o Delta do Parnaíba e o mangue que separa Cajueiro da Praia, do Ceará... aquele trecho de areia grossa, alta, irregular...aquela costurazinha de nada, em que as linhas das pipas dos kites se embaraçam com as linhas das redes dos pescadores. Ali onde o vento é o propulsor do movimento, o que alegra na presença e o que causa caras amarradas e inquietude na ausência... É bem ali. Bem ali, olhe lá. Cuscuz um pouco seco pro meu gosto, pão de massa fina, beju, café pra deixar a gente gelado de tanto suar. Entre estradazinhas de piçarra, entre pés de chinelas largados, cães dormindo no meio da rua, jumentos em bandos, jumentos solitários, jumentinhos e suas mãezinhas zelosas, jumentos disparados correndo no nada pra lugar algum. Entre árvores de ciúme, cactos alquebrados, vacas comendo lixo. Entre cajueiros frondosos, com os dias contados, até a próxima construção lhes ceifar. Entre grupos de estrangeiros, caminhando relaxados pelo meio das ruelas, com os corpos queimados de sol, os músculos doídos de tanto velejar. Através da praça cimentada que reflete o calor e dá rumo aos perdidos. A igrejinha de linhas retas, branca e azul, contra a cruz branca no chão. Um toque interiorano em meio a um entorno que ganha ares de comércios apressados. Cultos estridentes, que transformam todos em crentes, divididos em dois grupos bem distintos, de essências opostas . Pedem, a um Jesus um tanto surdo, alívio para as aflições cotidianas e livramento. O pecado, este tal pecado. Igual no mundo todo, mas ainda setorizado por burocracias. Ali naquela praia. Onde ônibus despejam turistas aglutinados em grupos homogêneos. Caixa de som no ombro, caixa térmica, sacolas, apetrechos pra desfrutar do dia de sol. A farofa é patrimônio nacional. Praia sem farofa, domingo sem macarronada. Vai na contramão dos hábitos brasileiros mais democráticos. É mesmo ali, entre rajadas de vento e areia, entre sargaço, vazantes quilométricas, rostos conhecidos de estranhos, amigos cumprindo seu ritual rotineiro de passeios com seus cachorros, caminhadas solitárias, silêncios interrompidos por prosa boba e boa, meditações que não veem seu fim, porque alguém chegou sem avisar, e logo sugere uma cerveja. É neste pontinho minúsculo dos 7 mil e tantos quilômetros de litoral brasileiro, que meu coração se põe com o sol, pra renascer de imediato nas estrelas, planetas e satélites, assim que a escuridão tão lindamente os revela.
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Tudo tão lindo, tão rústico, tão longe... E tão dentro do coração! ❤️ Ótima crônica sister!
ResponderExcluirTão real que chego a estar lá...sentindo cheiros...vendo as cores...vivendo cada palavra desta crônica.❤️��
ResponderExcluirAve Maria.. que lindeza..
ResponderExcluirArmaria, mulher! Que lindeza! 💙
ResponderExcluirQue texto gostoso de se ler,Andréa! Bacana!
ResponderExcluirVocê me transportou pra esse cantinho do planeta, muito bem descrito pelo olhar atento que capta a essência do lugar e repousa no silêncio e na poesia.
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