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quarta-feira, 18 de abril de 2018

Bem-vindos à GYN land.

      Foi então que uma bela tarde de janeiro eu aceitei uma oferta de trabalho e uma semana depois eu me mudei para Goiânia. Sigla GYN. Sugestiva para os beberrões e prática para procurar vôos pra casa. Mudança ainda mais repentina quanto foi a minha pra Barra Grande, Piauí. 
      Pois então logo apareceram as primeiras impressões, aquelas que nos marcam pra sempre, que se encaixam numa míriade de categorias que passam por injustas, distorcidas, realistas, subjetivas etc etc etc...
      A primeira delas foi a minha surpresa - pode escrever choque - ao notar a frota de carros da cidade. Am I in freaking Berverly Hills? Além do número de veículos que inundam as avenidas extensas, a impressão que tenho é de estar na cidade mais rica do país... ou mais endividada nos bancos de leasing. Sinto-me no carro dos Flinstons dirigindo meu carrinho popular, 1.0, em meio à multidão de reluzentes possantes. Mas logo percebi que o carro, este obscuro objeto do desejo, é o calcanhar de Aquiles do Goiano. Sempre que falo da minha tão querida primeira impressão, as pessoas me olham assim... com uma desconfiança do tipo, "que menina esquisita. Até parece que não quer dirigir nosso carro. Até parece que não deseja ardentemente uma mercedes crocante pra dirigir. Até parece que não quer este símbolo tão evidente do status pra ganhar 5 estrelinhas no app da vida." Inútil seria dizer que não... Então, não digo nada e sigo guardando minha primeira impressão pra mim. Como se pode notar nesta crônica, em que nem a mencionei. 
      Outra coisa que os Goianos levam muito, mas muito a sério: sanduíches. Não me venha com amadorismo. Aqui a coisa é profissa. Pela quantidade de lanchonetes que existem, penso que eles realmente amam sandubas. Conversando com uns alunos, comentei que vi dezenas e dezenas de "carrinhos de lanche" e "trailers de lanche". Eles quase me mataram. Nãaaoooo, não são nem carrinhos, nem trailers, está doida? São pit dogs, outro nível. Ahhhhh, sim. Dos sanduíches não posso dizer, porque não como carne e não experimentei nenhum. Mas o local... os pit dogs... são... assim, trailers! Só que com uma infra que lhes confere o status de pit dog. Certo? Vamos deixar isto combinado, então. Existe um "puxadinho" pra colocar mesas e cadeiras, e o trailer ganha uma decô maix moderrrrninha. E há muitos deles. Todos cheios à noite. Mas o mais curioso é que parece que o goiano não estaria aproveitando este filão de mercado na sua plenitude se ele abrisse apenas uma sorveteria. Então ele coloca lá: Sorveteria E Lanchonete. E por que ser apenas uma pastelaria se posso ser uma Pastelaria E Lanchonete? Não vou perder a confiança do povo Goiano se eu abrir apenas uma mecânica? Sim, claro que vou. Então eu abro uma Mecânica E Sanduicheria. Agora sim, plano de negócio completo. Já fico imaginando que há muitos profissionais liberais que temem perder a credibilidade se colocarem apenas: Dra. Xanaína Marques. Ginecologia e Obstetrícia. Então ela se vê obrigada a colocar? E Lanchonete. Há, certamente, J & J . Advogados Associados E Lanchonete. Porque não adianta ser goiano, tem que respeitar a cultura local. 
      Eu mesma tive a inspiração, estes dias, de um negócio próprio. Estava indo à pé a uma conveniência perto de casa. Passando em frente a uma casa vizinha, ouço um gemido de um homem. Era quase sexual. Mas não exatamente. Ele continuava, sem parar. Parecia estar no quintal / varanda da casa. Fiquei morrendo de curiosidade. Pensei, vou espiar na fresta do portão. Olhei. E o que vi me deu um estalo empreendedor. O cara, já um senhor com idade pra ser aposentado (no Brasil, isso significa com quase 120 anos), estava sentado no corredor ao lado da casa dele, numa cadeira velha, usando um cotonete. Ele estava gostando tanto da coisa, que gemia, gemia e usava o cotonete, como se fosse um pecado capital. E é! Se formos ver a quantidade de contra-indicações por usar um reles cotonete. Esses vídeos horrorosos que são postados na internet, mostrando o que acontece quando você limpa o ouvido com um cotonete... que horror! Eu simplesmente não quero sabeeer! Eu e aquele senhor e metade da população do Brasil queremos usar o cotonete sem informação alguma. Queremos socar o cotonete beeem dentro do ouvido e sim, ter aquele prazer culpado de socar a cera mais pra dentro e correr sim o risco de inflamar, infeccionar, perfurar o tímpano, porque o ouvido é nosso e a gente faz com ele o que bem entender. Eu entendi na hora o prazer do senhor velho aposentado sentado no corredor do lado de fora da casa usando o cotonete como se fosse algo proibido. E decidi que, quando tiver o capital todo, vou abrir uma COTONETERIA. Um local onde você pode ir, com toda a privacidade de quem precisa extravasar um desejo quase secreto, e usar o cotonete avançando quantos milímetros você bem entender pra dentro do seu ouvido, atravessando o tímpano, desestruturando o martelo, a bigorna e o estribo, atingindo a cóclea, o trópico de câncer e o de capricórnio e ainda gemendo o quanto você bem entender. Sem mulher / marido / filho / pai / mãe / sogra e nem ninguém pra gritar: "Você não pode usar o cotonete deste jeito que vai acabar ficando surdooo!!!". Minha cotoneteria vai contar com cadeiras confortáveis, estilo chaise long, camas, pufes, redes, banquinhos, sofás, e toda a parafernália pro cliente desfrutar de momentos relaxantes, música ambiente, drinques e chás e o escambau. Claro, haverá sempre um otorrinonaringologista de plantão, de cara amarrada, contrariado, para avaliar possíveis danos às estruturas delicadas do nosso amado ouvido. Mas ele estará proibido de emitir qualquer tipo de represália quanto ao uso que o cliente quiser fazer do cotonete. E também a COTONETERIA só vai trabalhar com cotonetes da Johnson. Nada daquelas outras marcas mequetrefes em que o algodão se desfaz e não é acolchoado o suficiente pra causar o prazer desejado. Pelo contrário! O algodão sai e a haste (nada flexível) espeta você e as luzes se acendem, e você volta do êxtase como que tivesse levado um choque. No entanto, e aqui é que está a conclusão do meu plano de negócios... um pouco divagante, mas bem pautada em anos de experiência e muita pesquisa de mercado... a COTONETERIA, por ser inaugurada em Goiânia, terá que ter um importante anexo. Justamente para não perder a confiança do cliente mais raíz, contará com uma ... sim, LANCHONETE. Fazendo assim, história na cidade e no país! A primeira COTONETERIA E LANCHONETE do Brasil. 
     Fico contente de poder compartilhar meus planos, embora este não fosse o objetivo principal da crônica, foi este rumo que ela tomou. Goiânia não sairá daqui, e pelo visto, eu tampouco. Ainda dá tempo pra muita prosa sobre cidade berço de muitas celebridades da música sertaneja e do empadão mais mortífero pra uma vegetariana como eu. 

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